Claudia Salomon fez história a 1 de julho de 2021, ao tornar-se a primeira mulher Presidente da Corte Internacional de Arbitragem da ICC, a instituição arbitral internacional mais importante do mundo. Claudia Salomon falou com Barry Fletcher, Chefe de Arbitragem da LexisNexis® UK, sobre as suas primeiras semanas na função, o seu compromisso com a diversidade e a inclusão e como pretende construir sobre o sucesso do seu antecessor de modo a garantir uma mentalidade focada no cliente, na Corte e na Arbitragem ICC.

O  anúncio em novembro de 2020 de que Claudia Salomon tinha sido recomendada para suceder a  Alexis Mourre enquanto presidente da Corte da ICC foi recebido com aclamação generalizada. Como ex-sócia e co-coordenadora global de arbitragem internacional na Latham & Watkins e afiliada de longa data da Corte da ICC, inclusive como vice-presidente desde 2018, a experiência e a adequação de Salomon para a função eram claras. A proposta de nomeação de uma presidente do sexo feminino para a Corte da ICC também foi saudada por muitos como a confirmação do compromisso da ICC para com o equilíbrio de género  na arbitragem.

Comprometida com a diversidade e a inclusão

As semanas iniciais do mandato de Claudia Salomon revelaram já com muita clareza que a diversidade e a inclusão estão na vanguarda da sua política para a Corte da ICC.

Primeiro, foi divulgada uma  convocatória global  para candidatos a uma nova Task-Force sobre Inclusão de Pessoas com Deficiência na Arbitragem Internacional. Como Salomon comentou na época, ”[para] refletir a comunidade empresarial global, devemos permitir a participação ativa de todos os profissionais qualificados, incluindo aqueles com deficiência”.

Uma segunda iniciativa de inclusão foi anunciada algumas semanas depois, desta vez a criação de uma  rede LGBTQIA dentro da própria Corte da ICC (como ponto de partida), com o objetivo de criar um espaço seguro e inclusivo para que os membros sejam eles mesmos – autênticos – em linha com a promessa da ICC’s World Business Pride.

Claudia Salomon queria ‘enviar uma mensagem forte’ sobre sua dedicação à diversidade e inclusão, que vê como ‘central, existencial e essencial’ para o trabalho da Corte da ICC e da ICC. O objetivo final dessas iniciativas, bem como das políticas relacionadas agora e no futuro, é garantir que a Corte da ICC e os serviços de resolução de litígios da ICC refletem toda a comunidade empresarial global e suas necessidades.

Claudia Salomon lidera a Corte da ICC mais diversa da sua história: 195 membros são oriundos de 120 países, com mulheres na sua maioria, e uma representação de África maior que nunca.  Embora reconheça o progresso feito até o momento, Salomon prepara-se para fazer mais, incluindo em conjunto com os comités nacionais da ICC.

No entanto, o papel da Corte da ICC na seleção de árbitros para nomeação é, obviamente, apenas parte do quadro.

De acordo com Salomon, 75% dos árbitros da ICC são nomeados pelas partes (e as suas nomeações são confirmadas pela Corte da ICC) ou por co-árbitros, o que significa que a Corte da ICC se centra apenas em 25% das nomeações.

No que diz respeito às nomeações de partes interessadas, os advogados têm um papel importante a desempenhar, mas as partes também. De acordo com Salomon, a comunidade empresarial mundial tem a capacidade de garantir que as propostas / nomeações sejam diversas, com as partes fazendo os mesmos requisitos de diversidade para seus painéis arbitrais e para os seus escritórios de advogados. De acordo com  o relatório da ICC sobre as estatísticas de 2020, foram indicadas mais mulheres pelas partes do que pela Corte da ICC, o que talvez reflita o aumento da prevalência de tribunais de três membros nas Arbitragens ICC e a proporção de casos em que a Corte da ICC é chamada a nomear árbitros.

Uma mentalidade focada no cliente

Ao falar com Claudia Salomon sobre qualquer assunto não demora muito para que o foco da conversa se volte para as necessidades dos utilizadores finais da arbitragem: as partes. Claudia Salomon dedica-se a adotar uma mentalidade totalmente focada no cliente, um tema que explorou durante sua  palestra na Atlanta International Arbitration Society   no início deste ano.

Quanto a como isso será alcançado na prática, Salomon diz que pelo menos haverá iniciativas focadas no envolvimento das partes. Isso vai mais além de simplesmente oferecer ferramentas para as partes: o objetivo é aumentar o envolvimento do  advogado interno no processo de arbitragem, refletindo o seu atual papel junto das suas organizações e de avaliadores de risco.

Claudia Salomon gostaria por exemplo que os tribunais arbitrais tomassem medidas simples como encorajar (sempre que haja vontade) os representantes das partes / advogados internos a serem copiados em todas as comunicações do tribunal e a participar nas conferências processuais iniciais para que possam influenciar a forma e o cronograma da arbitragem. Isso pode ajudar a alinhar a arbitragem com as expectativas das partes e pode ainda ter um impacto positivo nos custos e na atenção às questões de fundo.

Essa abordagem, para Claudia Salomon, também reflete o foco da ICC nas necessidades das PMEs que representam uma parte importante da economia mundial e que foram, geralmente, fortemente afetadas pela pandemia. Uma das principais prioridades para o seu mandato é comunicar claramente a este grupo como a ICC pode ajudar a resolver disputas de baixo e médio valor, incluindo: (1) os serviços do Centro Internacional de ADR; (2) o procedimento de arbitragem expedita, que foi um ‘sucesso’ ; e, (3) a adaptabilidade da arbitragem ICC a todos os tipos de disputas, não apenas para disputas de construção complexas (pelas quais a ICC é bem conhecida).

Retomando o tema da legitimidade neste contexto, a nova Presidente pretende fomentar uma cultura de transparência em relação à Corte da ICC, respeitando ao mesmo tempo a vontade das partes e a confidencialidade.

A disponibilização às partes das razões das principais decisões da Corte (incluindo sobre impugnações de árbitros) tem sido possível desde 2015. Salomon espera novos desenvolvimentos na transparência da tomada de decisões, levando, talvez, no devido tempo, à publicação de um compêndio de decisões de impugnações anónimas (algo que a LCIA fez com bons resultados), ajudando a desmistificar o processo de tomada de decisão em benefício de todos os interessados, fortalecendo a confiança no sistema.

Um papel cada vez maior para a tecnologia

Sob a liderança de Claudia Salomon, as partes interessadas em Arbitragem da ICC podem esperar ver a tecnologia ser cada vez mais adotada nas atividades de gestão e administração de casos, bem como durante os próprios procedimentos de arbitragem, por exemplo, o uso contínuo de videoconferência em audiências. Embora considere que a inteligência artificial ainda não representa uma ameaça existencial para os árbitros na sua capacidade de tomada de decisão, Claudia Salomon espera que os avanços nesta área afetem a prática arbitral, por exemplo, no que diz respeito à revisão de documentos cada vez mais sofisticada. A ICC deseja manter-se em linha com a prática atual sobre o uso de tecnologia, por isso deverá rever o seu relatório sobre o assunto, publicado originalmente em 2004.

Os seguidores da Corte da ICC deverão lembrar-se de anúncios feitos durante a Semana de Arbitragem de Hong Kong 2017 sobre o lançamento iminente de uma plataforma interna e externa de gestão de casos on-line. Ao explicar que os planos da instituição nesse respeito tinham-se tornado mais ambiciosos com o tempo, Claudia Salomon afirmou que deveríamos ‘ficar atentos’ a novas notícias sobre este projeto.

O impacto da pandemia

Como muitas, a ICC também precisou de se adaptar para enfrentar os desafios impostos pela pandemia do coronavírus. A Corte da ICC emitiu orientações detalhadas dirigidas aos participantes em arbitragens ICC ao longo de 2020, algumas das quais fizeram mudanças permanentes na prática da arbitragem ICC por meio de emendas às Regras de Arbitragem da ICC  e às Notas de apoio às Partes e Tribunais Arbitrais sobre a Conduta da Arbitragem. Claudia Salomon confirmou que o Corte e a Secretaria da ICC continuam a funcionar remotamente por enquanto, mas  adiantou que espera fomentar uma cultura de envolvimento mais frequente e com maior participação, mais possível agora com a normalização do atendimento remoto .

Diante de uma pergunta quase inevitável sobre o futuro a longo prazo das audiências remotas na arbitragem internacional, Salomon declarou que espera que prevalência de audiências presenciais da era pré-pandémica, seja aos poucos ‘invertida’, à medida que saímos da pandemia.  Claudia Salomon compartilha da opinião expressa por outros de que a maioria das audiências processuais podem ser tratadas  remotamente, embora as audiências presenciais sejam mais apropriadas para audiências de prova. As partes e os advogados internos estarão agora mais atentos à opção de proceder remotamente do que antes, bem como ao custo e a outras vantagens que isso pode oferecer em casos específicos.

Considerações finais

Claudia Salomon descreveu as suas primeiras semanas no cargo como um ‘turbilhão maravilhoso’ e elogiou a dedicação impressionante do Secretariado da ICC e dos membros da Corte da ICC. – está “animada” por poder lançar novas iniciativas estratégicas focadas nas partes e por poder contribuir para moldar a Arbitragem ICC e a arbitragem internacional em geral Tudo indicam que o futuro da Corte da ICC e a Arbitragem ICC se encontra em excelentes mãos.